27.12.06

Anno Caos 2007 (Agenda TP)

Gostariamos de contar com ajuda de todos vocês para elaborarmos juntos uma espécie de "Calendário do Caos", com datas significativas (ou não) para todos os Terroristas Poéticos e Erisianos.

Esse calendário servirá para já termos previamente organizados umas atividades e ir disseminando uma certa "cultura Erisiana".

As datas servirão para relembrar acontecimentos significantes e impulsionar o TPista a realizar atividades em conjunto, de âmbito até nacionais.
(Individualmente pode-se acrescentar datas de significância regionais e até pessoais, por que não!? Afinal, essa é a agenda do caos!!!)

Sugestões - Agenda TP 2007 / Ano do Javali

JANEIRO
01 - Dia da Confraternização Universal
01 - Deusa Tripla - Europa, Wicca; Deus Janus – Roma
01 - Dia Mundial da Paz
06 - Dia de Reis
07 - Dia do Leitor
07 - Dia da Liberdade de Cultos
08 - Dia da Fotografia
30 - Dia da Saudade
31 - Dia da Solidariedade
31 - Dia Mundial do Mágico
31 - Candlemas

FEVEREIRO
01 - Lughnasadh
06 - Honras a Afrodite, Deusa do Amor
14 - Dia Internacional do Amor (Valentine's day)
16 - Dia de Faunos, Honras a Pãn
17 – Dia de Kali
24 – Shivaratri, Vigília ao Deus Shiva
26 – Festa da Carne

MARÇO
01 - Dia do Turismo Ecológico
02 - Dia do Turismo
08 - Dia Internacional da Mulher
14 - Dia da Poesia
20 – Mabon
21 - Dia Mundial da Infância
21 - Dia Internacional da Floresta
22 - Ostara
23 - Dia da Juventude
27 - Dia Mundial do Teatro
27 - Dia do Circo
27 - Liber Pater- Dia dos Homens

ABRIL
01 - Dia do Humanismo
01 - Dia da mentira
02 - Dia Internacional do Livro Infantil
07 - Dia Mundial da Saúde
13 - Dia dos Jovens 1
13 - Dia Internacional do Beijo
15 - Dia Mundial do desenhista
15 - Dia da Terra
16 - Dia da Voz
18 - Dia do Livro Infantil
18 - Dia do Amigo
19 - Dia do Índio
20 - Dia do Disco
20 – Aniversário de Bartholomeu Simpson
22 - Descobrimento do Brasil (1500)
22 - Dia do Planeta Terra - Gaia
23 - Dia Mundial do Livro
29 - Dia Internacional da Dança
29 – Dia da Árvore
30 - Dia da Mulher

MAIO
01 - Dia Mundial do Trabalho
01 – Sabbat de Beltaine (Hemisfério Norte)
01 - Samhaim
03 - Dia do Sol
05 - Dia da Comunidade
05 - Dia das Comunicações
07 - Dia do Silêncio
08 – Dia do Genki-Dama
08 - Dia do Artista Plástico
09 - Morte de Ulrike Meinhof
17 - Dia Internacional das Telecomunicações
18 - Dia Internacional dos Museus
27 - Dia Mundial dos Meios de Comunicação
28 - Dia do Educador

JUNHO
05 - Dia Mundial do Meio Ambiente
07 - Dia da Liberdade de Imprensa
06 – Dia de Satan
12 - Dia dos Namorados
12 - Dia do Correio Aéreo Nacional
13 - Dia do Turista
19 - Dia do Nacional do Cinema
21 - Dia do Intelectual
21 - Solsticio de Inverno
23 - Noite das Feiticeiras
27 - Dia dos Artistas Líricos

JULHO
05 – Fim do Mundo para a Igreja dos Subgenius
10 - Dia da Pizza em SP
13 - Dia Mundial do Rock
14 - Dia da Liberdade de Pensamento
15 - Dia Internacional do Homem
17 - Dia de Proteção das Florestas
19 - Dia Nacional do Futebol
20 - Dia Internacional da Amizade
20 – Dia do Pulo
25 - Dia do Escritor
31 - Dia do Orgasmo

AGOSTO
01 - Imbolc
11 - Dia do Estudante
12 - Dia Nacional das Artes
14 - Dia do Artista Plástico
15 - Dia dos Solteiros
19 - Dia do Artista de Teatro
20 - Dia do Vizinho
24 - Dia do Artista


SETEMBRO
07 - Dia da Independência (1822)
11 - Dia do Terrorismo Poético
21 - Dia da Árvore
22 - Dia da Banana
22 - Dia do Amante
23 - Equinócio da Primavera
27 - Dia Mundial do Turismo

OUTUBRO
04 - Dia da Natureza
04 - Dia Internacional do Poeta
04 - Dia Mundial dos Animais
05 - Dia Internacional dos Professores
12 – Dia de Aleister Crowley
07 - Dia do Compositor Brasileiro
15 - Dia do Professor
15 – Dia de F. Nietzsche
25 - Dia da Democracia
29 - Dia do Livro
31 - Dia das Bruxas

NOVEMBRO
01 – Dia Internacional da Cannabis
01 - Beltane
02 - Dia dos Mortos
05 - Dia da Cultura
05 - Dia do Cinema Brasileiro
22 - Dia da Música

DEZEMBRO
10 - Dia do Palhaço
16 - Dia do Teatro Amador
22 - Solstício de Verão
25 – Sol Invictus

Ainda sugerimos colocarmos mais umas datas, mas teremos que discutir o dia exato de colocá-las.

São:

-Dia de Éris
-Dia de Hakim Bey
-Dia Nacional da Discórdia
-Dia da Pornografia
-Dia das Conspirações

Interessados comparecer aqui e/ou aqui

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7.12.06

Julgando Godot

Algo ainda não faz sentido. Mas isso faz.

13.11.06

Discordia Brasilis - O Recrutamento

Discordia Brasilis - O Livro:

Discordianos do Brasil!

Está iniciado o projeto do livro Discordia Brasilis, um livro discordiano feito em conjunto. Este livro coletivo será o primeiro de muitos. Discordianos, contribuam com o que quiserem: textos, desenhos, fotos, dinheiro, sexo, trabalho escravo, etc...
Seja como for, como quer que seja, não sem antes um cachorro quente, entretanto...

Discordia Brasilis - O Zine:

Colocaremos neste zine tudo o que pode ir para o Discordia Brasilis para assim experimentar.

Colaborações (idéias, textos, demais contribuições) através do e-mail discordianismo@gmail.com e na comunidade Sabedoria Insana

Salve Éris!

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16.10.06

A Frente de Libertação dos Anões de Jardim ataca novamente

Pois agora, preocupada com o futuro dos seres diminutos, a FLNJ resolveu ir mais longe em sua luta. Não contente em apenas libertar os anões de jardim, ela agora quer que eles sejam mandados para escola para aprenderem a viver em sociedade.

No dia da volta às aulas após o feriado escolar, a FLNJ praticou sua mais ousada ação até hoje. Uma célula do grupo libertou 86 anões de jardim e os levou para o pátio de uma escola pública em Limoges, no interior da França, para que, educados, eles tenham direito a um futuro melhor e esqueçam o sofrimento do passado.

Quem são eles?

Desde 1997, a Frente de Libertação dos Anões de Jardim ganhou notoriedade na França, tendo raptado (ou libertado, como afirmam) mais de 6.000 gnomos.
O destino final que dão à maioria dos bonecos é desconhecido. Certa vez, 11 deles foram encontrados enforcados sob uma ponte.
Ao lado dos anões de jardim pendurados pelo pescoço havia uma recado: “quando vocês lerem essas palavras, já não seremos mais parte de seu mundo egoísta no qual servimos apenas como peça decorativa”.
No caso de roubo coletivo de Sant-Die-des-Vosges, o final foi mais feliz.
Um padre encontrou os anões em formação, como se estivessem indo à missa.
A maior parte dos bonecos recuperados continua aguardando seus donos buscá-los num armário empoeirado da delegacia de polícia.
Um dos motes da polícia de Sant-Die-des-Vosges neste final de ano é: por favor, encontre uma casa para um gnomo neste Natal e Ano Novo.
São a célula discordiana que mais inspira devotos de Éris espalhados pelo mundo a fim de exercerem a nossa jihad, a nossa guerra de fé,conhecida por nós como Operação:Mindfuck.

fonte: 1001gatos.org

24.8.06

Delírio Coletivo

E fez-se a luz!

Ou não.

Período Nonsense

Ao longo da história, a maioria dos movimentos literários e artísticos contradiziam o movimento anterior. O Renascimento foi contra tudo o que a Era Medieval disse, o Realismo negava os fundamentos do Romantismo e assim por diante.
Já o movimento Nonsense resolveu que não gostaria de contradizer o movimento anterior, no caso, o Modernismo e a Pop Art, o Nonsense quis negar absolutamente tudo ou não negar absolutamente nada.
Sob a máxima "Pra que fazer sentido!?", esse movimento cria uma contradição de tudo e dele mesmo, com raízes em todos os estilos literários e tendo por característica a abolição da linguagem figurada, nada mais era figurativo, tudo era real, e o que era real não existia, ou existia, ou o que quer que o leitor prefira.

O que aconteceu foi que no fim do século XX e começo do século XXI, com o fim da Guerra Fria, a ascensão dos EUA como maior força política e econômica do mundo, detendo um poder quase imperialista e com a estagnação de todo e qualquer movimento revolucionário, o mundo conheceu um período de conformismo em que qualquer coisa era uma revolução. Andar fantasiado, por exemplo, ou simplesmente usar um nariz de palhaço pela rua, já causava um grande choque por quebrar a monotonia cotidiana. O movimento DC, autor da obra Sofia, foi um dos primeiro a notar isso e adotar a idéia do Nonsense.

Da idéia para a prática foi um pulo. Embora no começo, apenas algumas pessoas tivessem adotado essa "revolução", assim como em qualquer outra já ocorrida, o clima e as idéias sem sentido foram tomando proporções mundiais e o mundo conheceu uma época maravilhosa, onde a espontaneidade e a imaginação tomaram conta de todos e tudo passou a ser fantástico e irreal. Chegou até a haver um certa desaceleração nas pesquisas cientificas, afinal não importava mais provar que pode-se dividir uma célula infinitamente.

Antes desse movimento, as pessoas buscavam uma explicação científica para tudo, mas depois ninguém mais queria a explicação lógica e inteligente. Todos perceberam que a fantasia era bem melhor, que cada um poderia formular sua própria teoria para qualquer coisa, todas as lendas sobre os "porquês" voltaram à tona e todos os povos buscavam as raízes de suas culturas para saber algo, quando não encontravam, criavam uma nova cultura.
Em meados da década de 10 do século XXI, o mundo já não fazia sentido algum. Viam-se pessoas fantasiadas, nas ruas, nos supermercados e até nos escritórios você encontrava pessoas vestidas de Pantera Cor-de-Rosa ou Smurffle.
As casas tinham pinturas psicodélicas e, às vezes, achavam-se florzinhas desenhadas no meio da rua.
Com a população nesse incrível estado de espírito, era natural que as artes também seguissem esse caminho.

Leis Absolutas do Delírio Coletivo

1ª Lei Absoluta
PATAFÍSICA- Tudo é decidido pela imaginação e não pela razão.

2ª Lei Não Absoluta
Não encher as caras aos domingos.
Quem quer fazer sentido?
A realidade é relativa;
A Fantasia é bem melhor;
Arte, Poesia e Loucura.

3ª Lei Absoluta
Usar LSD.

4ª Lei Absoluta
Enlouquecer a Política.

5ª Lei Absoluta
Nenhum tipo de censura.
Mandar as preposições e a gramática pro inferno!

6ª Lei Absoluta
O que fazer em casos de incêndio?
Deixe queimar!

7ª Lei Absoluta
Jogar uma garrafa de conhaque no Delírio Coletivo

8ª Lei Absoluta
DELIRAR.

9ª Lei Absoluta
Assassinar a monotonia causada pela razão.

21.8.06

Lusus serius: Os manifestos Rosacruzes e a 'piada séria'

por Mike Jay

A publicação anônima dos três Manifestos Rosacruzes na Alemanha entre 1614 e 1616 foi e ainda permanece um do furores políticos mais explosivos jamais
inspirados por um corpo de escritos esotéricos. Sua conclamação pela "Reforma Universal e Geral de Todo o Grande Mundo" ao redor da compreensão hermética
do homem como um microcosmo da Natureza foi recebida com uma furiosa caça às bruxas por toda a Europa setentrional e promessas de morte e imolação a
qualquer membro da elusiva "Fraternidade Invisível".

Os manifestos originais foram aceitos quase que imediatamente por torrentes de panfletários, sociedades e contra-sociedades secretas, tanto protestantes quanto
católicas, agentes provocadores, Fraternidades 'falsas' e espiões. Quando o furor passou, estava claro que não havia nenhum consenso sobre o que os manifestos
realmente eram. Alguns acreditavam que eram revelações inspiradas divinamente; outros (incluindo aqueles mais proximamente associados com eles) os
descartaram como um ludíbrio, ou 'um pouco de diversão'; outros os consideraram como uma fraude, ou um ato de dano político deliberado - ou Pactos Horríveis
Feitos Entre o Diabo e os Pretensos Invisíveis, como um folheto de Paris definiu.

Enquanto as sementes jogadas pelos Manifestos originais se espalhavam, estas divisões aumentaram ao invés de diminuir. Hoje, Christian Rosenkreuz, o fundador
mítico da Fraternidade, é aceito como uma figura inspirada divinamente por muitos grupos esotéricos, inclusive os seguidores de Rudolph Steiner e a maioria dos
Rosacruzes assumidos; para a maioria dos estudiosos históricos, os manifestos são uma 'fraude' e o furor um caso de histeria de massa paranóide.

Está bastante claro que os autores anônimos (embora não completamente misteriosos) dos Manifestos consideravam ambas visões mal-direcionadas. Há evidência
para isto tanto nos próprios manifestos quanto nos escritos subseqüentes das partes envolvidas. Johann Valentin Andreae, o pastor suábio pietista intimamente
associado com os manifestos (certamente com o final, 'As Bodas Químicas de Christian Rosenkreuz'), foi bastante específico: "Em vão você espera pela vinda da
Fraternidade - a comédia está em um fim".

Mas "a fictícia fraternidade Rosacruz", como ele a chama, era obviamente mais que o ludíbrio que ele pretende. Os manifestos são trabalhos consideráveis, e
obviamente sérios em intenção - até mesmo se não literalmente verdadeiros. Parece provável que Andreae estava exasperado em descartá-los como uma piada
pelo fundamentalismo literal que estava crescendo ao redor deles, o qual ele estava a esta altura impotente para deter. Talvez uma descrição melhor dos manifestos
poderia ser a usada como título por outro apologista Rosacruz, Michael Maier - o Lusus Serius, ou 'piada séria'.

Não é difícil entender a frustração de Andreae com a inabilidade do público de permitir que as ambigüidades dos Manifestos permanecessem, ou aceitar que eles
deveriam ser lidos em mais de um nível. Não é como se, ao vestir sua mensagem em termos fictícios, os autores dos Manifestos estivessem fazendo qualquer coisa
radicalmente nova. O lusus serius já era uma forma estabelecida, com raízes em algumas das escrituras espirituais mais antigas, e continuou evoluindo em formas
contemporâneas que podemos reconhecer hoje.

Os Manifestos de fato oferecem um ponto de partida excelente tanto para uma análise dos efeitos que podem ser alcançados pelo lusus serius quanto às técnicas
que podem ser usadas para alcançá-lo. Eles são trabalhos excitantes, tantalizantes e inspiradores, alcançando o delicado equilíbrio de revelação e encobrimento que
tornaram o furor possível. Além disso eles alcançam a mistura de mensagem revelatória com ficção imaginativa de dois modos muito diferentes. O 'Fama
Fraternitatis', como o primeiro manifesto é conhecido, usa a forma de uma proclamação política para apresentar uma ficção como verdade; o manifesto final, as
'Bodas Químicas de Christian Rosenkreuz', usa a forma de uma narrativa alegórica para apresentar verdade como ficção.

O Fama é estilizado como um anúncio oficial, mas é uma chamada para que se unam à causa da Fraternidade que é 'invisível'. Este é um convite para uma reunião
sem hora ou lugar. Ao invés, explica como a Fraternidade passou a ser. Esta é a história de um sábio chamado Christian Rosenkreuz que morreu há 120 anos, mas
cuja câmara mortuária - e assim seu conhecimento e legado secreto - foi redescoberta recentemente.

A história de Christian Rosenkreuz é uma união de pontos das influências que se esperava que aqueles atraídos pela chamada considerassem muito. Os encontros
dele com os sábios de Damasco, Egito, Fez e Espanha falam da influência da magia, alquimia e kaballah; Paracelso é mencionado como alguém que tem feito algo
similar. Similarmente, a descrição da Fraternidade apresenta um ideal de estudo, cura dos doentes, ignorando "a descrente e amaldiçoada fabricação de ouro, que
passou tanto dos limites", e trabalhando discretamente para a mudança nos corações dos homens.

Estas duas criações, Christian Rosenkreuz e a Fraternidade, provaram ter uma longevidade que um trato mais prosaico nunca poderia ter alcançado - uma
longevidade que rapidamente tomou vida própria. Dentro de algumas gerações a maioria dos seguidores do ideal Rosacruz foram instados a acreditar na verdade
literal destas histórias; até que na época em que Shelley escreveu seu romance juvenil 'O Rosacruz', a imagem da Fraternidade Invisível de adeptos fazedores de
ouro era uma característica livre na consciência popular, sua fonte há muito esquecida: Shelley não mostra nenhum sinal de saber que os Manifestos sequer
existiram.

Mas esta 'literalização' dos Manifestos pelo público, e sua condenação como mentiras malignas pelas autoridades, pode ter vindo como uma surpresa aos seus
autores devido à tradição na qual eles estavam escrevendo. Muitos dos trabalhos que mais os inspiraram eram 'arcaizados', i.e. apresentados em uma forma que
sugeria que eram mais antigos do que de fato eram. Isto não era considerado uma 'fraude' - somente um modo elegante de dar ênfase às raízes e tradição da
escrita.

O exemplo mais famoso disto era, é claro, o 'Corpus Hermeticum', o corpo neo-platônico de diálogos mágicos e cosmológicos que eram, muito ironicamente,
tomados literalmente em suas alegações de terem sido passados de Hermes Trismegistus, o sábio legendário de tempos pré-clássicos. Era esta crença de que o
'Corpus' tinha centenas de anos de idade que foi realmente responsável pelo crescimento do movimento Hermético do tempo em que os diálogos foram traduzidos
primeiro por Ficino em 1463, e também pelo minguar dramático de interesse no mesmo movimento depois que eles foram corretamente datados por Isaac
Casaubon em 1614. Uma vez que esta descoberta se tornou amplamente conhecida, só os apologistas herméticos mais teimosos como Fludd e Kircher
continuaram a alegar sua verdade literal. Mas, como os próprios Manifestos deixam claro, a tradição hermética mal deveria se sustentar ou se abalar pela
apresentação arcaizada dos textos.

Tal arcaísmo era difundido no período helenístico onde revivificações (ou reinvenções) das religiões antigas era comuns. Muitos dos apocalipses judeus proféticos
escritos na época mostraram a mesma tendência arcaizadora: 'Jubileus', por exemplo, foi atribuído a Moisés, '1 Enoque' a um patriarca do alvorecer do tempo. Esta
técnica era, é claro, eminentemente adequada à profecia: o autor poderia revelar uma série de detalhes surpreendentemente precisos sobre o suposto futuro, o que
conferiria maior autoridade à revelação que se seguia.

Seria pouco generoso e perverso chamar este método de apresentação uma 'fraude' ou mentira: os autores podem acreditar na verdade literal do próprio arcaísmo
(hoje em dia chamado 'canalização'), ou podem estar apresentando sua revelação como alegoria e oferecendo a fonte arcaica como uma chave para decodificá-la.
Ou, novamente, eles podem estar usando o recurso para fins literários.

Há muitos exemplos mais próximos a nosso próprio tempo de todas estas abordagens, muitos dos quais tiveram sucesso em impulsionar o início de grandes
movimentos espirituais. 'Estrofes de Dzya' de H P Blavatsky, por exemplo, às quais seus livros 'Ísis Revelada' e 'A Doutrina Secreta' formam um comentário
estendido, são alegadas como fragmentos do "livro mais antigo do mundo", apresentado a ela em folhas de palmeira não-perecíveis pelos seus Mestres Invisíveis
Tibetanos. Na ausência de qualquer evidência corroboradora, a maioria dos não-teósofos é relutante em aceitar a verdade literal disto, embora Blavatsky tenha
negado veementemente o argumento de ludíbrio. Como seu contemporâneo Joseph Smith, cujo 'Livro Mórmon' se materializou de um modo semelhante, as queixas
de céticos tiveram pouco efeito no movimento resultante. (Mas uma vez que a 'Doação de Constantino', o documento que confere autoridade divina ao Papa, é
reconhecida hoje como sendo uma falsificação do século IX, temos que considerar realisticamente a autenticidade de revelação doutrinal como um luxo ao invés de
uma necessidade).

Um feito semelhante foi concretizado ao contrário pelo escritor de horror H P Lovecraft, que evoluiu seu antigo livro de sabedoria proibida, o 'Necronomicon', no
curso de desenvolver o suporte cósmico de seus os contos do 'Mito de Cthulhu'. Ele desfrutou do processo de aderná-lo o bastante para produzir uma publicação
e história de tradução fictícias, um ludíbrio que, como os Manifestos, passou a desenvolver uma vida própria, com a crença persistente na existência literal do livro e
uma subcultura de magia ritual dedicada a invocar sua prole cósmica. O próprio Lovecraft, que aproveitou toda a oportunidade para declarar seu convicto
materialismo, estaria sem dúvida ou entretido ou assustado por este curso de eventos. Para ele, o 'Necronomicon' era um conceito que concretizava o fascínio de
textos antigos e proibidos, muito como a história de Christian Rosenkreuz no 'Fama' concretizava o ideal do hermético iluminado. Os proponentes da mágica
Lovecraftiana podem, porém, apontar a seus vívidos sonhos como uma fonte de 'canalização inconsciente' do além da parede do sono.

É interessante comparar esta técnica de arcaização com outra variante que se desenvolveu neste século para se tornar um tema familiar de livros contemporâneos: o
documento ficcionalizado recebido não do passado mas do futuro. Isto foi largamente estabelecido por H G Wells em seus primeiros romances como 'A Guerra
dos Mundos' e 'A Máquina de Tempo'; embora o recurso tivesse sido usado antes, tinha sido tipicamente ou uma desculpa para um trato utópico ou uma sátira leve
de tradições contemporâneas. Ao usar isto como um dispositivo para tornar a profecia mais crível, a 'inovação estilística' de Wells pode ser vista em uma linha
direta de descendência do Antigo Testamento e apocalipses judaicos - e, evidentemente, na forma da radiodifusão de Orson Welles produziu o maior lusus serius e
furor subseqüente do século passado. (O próprio Welles depois produziu 'F para Fraude', uma apologia em filme para o lusus serius e a perversidade pós-moderna
em geral).

Talvez o contemporâneo equivalente mais próximo à forma do Fama são os trabalhos da Igreja do SubGenius, os antinômios anônimos surrealistas que propagam
sua mensagem no estilo das chamadas religiosas contemporâneas, as exortações de vendas por correspondência das igrejas evangélicas. Embora sua paródia seja
(esperamos) muito ampla para ser tomada literalmente, eles insistem na seriedade subjacente de sua mensagem: "Bem, se você pensou que esta Igreja era uma
piada, então por Deus você nunca vai entender a GRAÇA!". Mas apesar de várias tentativas louváveis, um furor na escala dos Rosacruzes permanece algo com o
que eles só podem sonhar.

. . .

Se o Fama era parte de uma tradição contínua de ficção vestida como verdade, as 'Bodas Químicas' ocupa uma posição na tradição ainda mais difundida de
verdade sob as vestes de alegoria narrativa. Mas era a combinação dos dois que é talvez sem igual, e era certamente unicamente efetiva. O chamado do 'Fama' era
uma lista de reivindicações e promessas grandiosas que urgentemente clamavam o tipo de substância que as 'Bodas Químicas' fornecia; em troca, a insistência do
Fama na "Reforma Universal e Geral de Todo o Grande Mundo" tornou certo que a alegoria das 'Bodas Químicas' era assiduamente varrida pelo seu significado
oculto.

Estudantes ansiosos de 'Bodas Químicas' foram não só recompensados com uma narrativa que ganhou uma reputação merecida de clássico de literatura esotérica,
mas uma na qual o espírito do lusus serius foi perpetuado. Também antedatado (a 1459), conta a história de sete dias na vida de seu protagonista, que é convidado
a um Casamento Real e faz uma viagem fantástica a um castelo onde um rei morto deve ser magicamente ressuscitado para seu próprio casamento.

O 'Bodas Químicas' está entre os mais agradáveis e facilmente legíveis trabalhos de seu tipo, muito notavelmente assim entre seus vizinhos alemães. As transições
fluidas de realidade para fantasia, através de sonhos, peças-dentro-de-peças e funcionamentos alquímicos, impelem o leitor por uma narrativa vívida e de
movimento rápido onde nada é o que parece. Até mesmo seus protagonistas são permitidos a desfrutar de si mesmos no curso de sua busca espiritual séria: durante
o pivotal "Quarto Dia" eles são todos reunidos para assistir uma peça que tem interlúdios leves ("Primeiro Interlúdio: aqui um leão foi disposto a lutar com um grifo,
e o leão ganhou; o que foi muito bom de assistir").

O 'Bodas Químicas', aproximadamente contemporâneo com o trabalho posterior e mais hermético de Shakespeare, delineia mais ou menos o ponto alto da alegoria
esotérica. Até mesmo mais que o arcaísmo do Fama, a forma alegórica teria sido imediatamente reconhecível a seus leitores contemporâneos. Dentro da tradição
alemã, seguiu discernivelmente de clássicos medievais como 'Parcifal' de von Eschenbach: muito foi feito dos paralelos entre os Cavaleiros do Graal, a Fraternidade
Invisível e o os 'Cavaleiros da Pedra Dourada' do 'Bodas Químicas', e também entre o milagrosamente preservado Titurel e o corpo não consumido de Christian
Rosenkreuz em sua câmara mortuária. Dentro da tradição esotérica mais ampla, sua forma lembra narrativas Sufi como a 'Conferência dos Pássaros' de Farid
ud-Din Attar, ou o clímax do contemporâneo neo-platônico do Corpus Hermeticum, o 'Asno Dourado' de Apuleius.

'Ficção esotérica', como o lusus serius, é algo como uma contradição em termos. Envolve duas coisas diferentes ao mesmo tempo: revelar uma mensagem espiritual
e construir um drama de personagens e ação. Já que ambos têm sua própria dinâmica, é freqüentemente necessário escolher entre eles. Os autores podem usar suas
intenções esotéricas na manga, proclamando a natureza revelatória de seu trabalho abertamente e abandonando a narrativa onde necessário para buscar seu
propósito 'sério'; ou eles podem focalizar suas habilidades em embutir a narrativa imperceptivelmente com o seu subtexto oculto.

Se nós incluímos esta segunda abordagem como 'ficção esotérica', então antes do século XVIII, a maioria dos grandes de Dante a Shakespeare a Milton (e depois
Goethe) entram na categoria; de fato, poderia ser mais simples compilar uma lista de autores que não codificaram sua ficção com um esquema esotérico. Mas da
Ilustração em diante, 'ficção esotérica' se torna distintamente mais marginalizada, emergindo novamente como um gênero popular apenas no século XIX. Neste
movimento vitoriano, porém, o espírito do lusus serius está largamente esquecido, e o toque leve do 'Bodas Químicas' está tradicionalmente perdido. 'Zanoni: Um
Conto Rosacruz' de Bulwer Lytton, por exemplo, permanece impenetrável à maioria dos leitores modernos, sua narrativa paralisada pela tendência de seus
Invisíveis Iluminados de interromper a história para oferecer sermões prolongados e bastante pomposos e também, de certo modo dramaticamente irritante, de
estar sempre certos.

Na vida real, Lytton era um estudioso oculto sensato e perceptivo, mas sua ficção 'esotérica' (por exemplo 'Vril: A Raça Vindoura, O Assombrador e o
Assombrado') continuou sofrendo destes defeitos. Ainda, há exceções honráveis do período, como o inacabado 'Manuscrito de Saragoça' de Jan Potocki, um
trabalho no estilo vivo, irreverente e ritmado do picaresco do século XVIII, que é uma delícia para ler e rememorativo ao 'Bodas Químicas' de modos bastante
específicos para sugerir que Potocki estava familiarizado com ele. O 'Manuscrito de Saragoça' é dividido de forma similar em dias numerados na vida do
protagonista, a maioria dos quais, como o 'Bodas Químicas', inclui tanto incidentes de despertar e um sonho (com trocas delirantemente confusas da realidade entre
estes), e características que um Cabalista à busca uma revelação divina que faz um paralelo com as próprias experiências do protagonista.

Embora o legado do estilo de 'ficção esotérica' de Lytton tenha sobrevivido até o presente, a influência do 'Bodas Químicas' e o lusus serius passou a duas escolas
distintas de literatura contemporânea. Por um lado, as idéias dos Manifestos foram exploradas por literati esotérico que trataram de forma inteligente com
conspiração oculta (e.g. Eco em 'O Pêndulo de Foucault') e as implicações metafísicas do lusus serius (e.g. Borges em 'Orbis Tertius'). Mas estes são trabalhos
sobre os assuntos evidenciados pelos Manifestos, em lugar de seus verdadeiros sucessores. A forma dos manifestos - o trabalho revelatório em roupagem de ficção
- é mais claramente visto em best-sellers como a série Don Juan de Castaneda, 'O Alquimista' de Paulo Coelho e suas seqüências, 'buscas espirituais' como 'A
Profecia Celestina' e a enorme subcultura de narrativas 'canalizadas' de aliens e anjos. Estes compartilham com os Manifestos a pretensão de ser 'mais que ficção',
para não serem lidos apenas pelo seu mérito literário. Podemos sentir que há pouco mérito literário para lê-los, que em contraste, os Manifestos são obras-primas
literárias, e muito mais, mas podemos reconhecer o legado em forma se não em qualidade.

Talvez os escritores contemporâneos mais próximos de ligar estas duas escolas são Robert Shea e Robert Anton Wilson cuja série 'Illuminati!' lida com os assuntos
históricos dos Manifestos enquanto também se apresentam meio-seriamente como 'livros para viver de acordo com' e revelações de sabedoria oculta. Em seu
melhor, eles alcançam o lusus serius em sua forma de contracultura moderna: estes são livros que apenas hippies paranóicos tomarão seriamente, ou é exatamente
isto que Eles querem que você pense?

Claramente, procurar equivalentes modernos precisos dos Manifestos é cair na armadilha de literalismo que sempre foi não entender o essencial. Como Goethe
disse do 'Bodas Químicas', "haverá uma estória para ser contada no momento certo, mas terá que ser renascida - não pode ser desfrutada em sua pele antiga". Nós
não estamos mais na posição dos autores originais de cristãos místicos pietistas tentando uma revolução da igreja e política: isso realmente era um jogo sério, e um
que iria levar a Fraternidade Invisível ao conflito militar efetivo. Mas os Manifestos tiveram sucesso em transmutar sua mensagem de ludíbrio para lenda; e a arma
do lusus serius ainda está lá ser para ser descarregada por qualquer um que possa adaptar sua sensibilidade ao mundo que encontrar ao seu redor.

Fonte: http://www.ceticismoaberto.com/fortianismo/rosacruz.htm

17.8.06

Groucho-marxismo

“O groucho-marxismo, teoria da revolução pela comédia, é muito mais do que um esquema para a luta de classes: como uma luz vermelha na janela, ilumina o
destino inevitável da humanidade, a sociedade déclassé. O groucho-marxismo é a teoria do deleite permanente”, explica logo nas primeiras linhas Bob Black,
ativista, cientista social norte-americano e autor do mais novo título da Coleção Baderna: Groucho-Marxismo.
O cientista social de extrema esquerda questiona o comportamento dos militantes de esquerdas, “pseudo intelectuais” que, segundo ele, estão preocupados em se
mostrar responsáveis para serem aceitos nos “grandes salões” da sociedade. Para Bob Black, os pervertidos sexuais não são mais os membros da TFP, mas sim a
esquerda, a única que defende sinceramente a tradição, a família e a propriedade.

Autor de textos polêmicos publicados em veículos como o Wall Street Journal e a revista Village Voice, o escritor faz uma verdadeira ode ao que ele entitulou de
teoria groucho-marxista. Não se trata de anarquismo ou de uma teoria comunista ou socialista. Aliás, o estudioso faz duras críticas a todos esses movimentos. “Os
anarquistas não se entendem sobre trabalho, industrialismo, sindicalismo, urbanismo, ciência, liberdade sexual, religião e um sem-número de coisas mais
importantes, especialmente quando tomadas em conjunto. Há mais pontos discordantes do que qualquer coisa que os una”, afirma Black em um dos capítulos do
livro entitulado “Meu problema com o anarquismo”, dedicado ao pensamento anarquista.

Já sobre o marxismo, no capítulo destinado a tratar as “Palavras de Poder”, Bob Black é taxativo: trata-se do “estágio mais elevado do capitalismo”. Outras
palavras de poder que merecem destaque:

Arte? Um substituto cada vez mais inadequado para o sexo.
Civilização? A doença de pele da biosfera.
Política? Como um brejo – tudo o que é sujo acaba subindo.
Serviço militar? Conheça o abatedouro.
Punks? Hippies com amnésia.
Punques? Punks que cursam escolas de arte.
O rock? Tem um grande futuro por trás.
Vegetarianos? Você é o que come.
Vida após morte? Por que esperar?

Com muito humor, a linha filosófica groucho-marxista prega que “se a revolução não servir para dançar e rir, não será nossa revolução”. Em “A abolição do
trabalho” o autor discorda e lança argumentos contundentes contra uma das grandes bandeiras socialistas: a questão do pleno emprego. Ele avalia todos os lados
da moeda, inclusive o “não-trabalho”: “O lazer é o não-trabalho em nome do trabalho. O lazer é o tempo gasto se recuperando do trabalho e na frenética, porém
vã, tentativa de esquecer o trabalho”. Bob Black vai mais além: “A principal diferença entre o trabalho e o lazer é que trabalhando pelo menos você é pago por sua alienação e exasperação”.

“[Bob Black] supera qualquer ensaísta político vivo... o trocadilho mais rápido do Oeste”, define Hakim Bey, outro autor da Conrad – escreveu Caos - Terrorismo
Poético e outros Crimes Exemplares e TAZ Zona Autônoma Temporária, também da Coleção Baderna

O autor

Bob Black tem uma formação acadêmica respeitável (graduações em ciências sociais e direito, dois títulos de mestrado), mas rejeitou desde o início os dois
caminhos principais apresentados à intelectualidade “séria”: a segmentação cientificista liberal ou o cinismo da esquerda frígida. Em vez disso, tornou-se famoso pelos cartazes anarquistas/situacionistas/absurdistas que criou à frente da “Última Internacional”, entre 1977 e 1983

Além da ação panfletária, escreveu também centenas de ensaios, distribuídos indistintamente entre periódicos anarquistas, jornais da área de direito e órgãos da
grande imprensa, como Wall Street Journal, Village Voice, Semiotext(e) e Re/Search. Publicou Friendly Fire, em 1992, Beneath the Underground, em 1994, e
Anarchy after Leftism, em 1996. O texto The Abolition of Work and Other Essays que faz parte do livro Groucho-Marxismo - é o capítulo “A abolição do
trabalho” - foi publicado originalmente em 1985. Também foi um dos pioneiros na divulgação do situacionismo nas Américas. Sua capacidade singular para criar
jogos de palavras, aliada ao humor ácido e ao conhecimento teórico, faz dele um dos grandes nomes do anarquismo heterodoxo.

Fonte: http://www.portal364.com/m5.asp?cod_noticia=9155&cod_pagina=1013


TESES SOBRE O GROUCHO-MARXISMO
Bob Black

1

Groucho-marxismo, a teoria da revolução cômica, é muito mais que um projeto para a luta de classes: como uma luz vermelha numa janela, ele ilumina o destino
inevitável da humanidade, a sociedade desclassificada (1). G-Marxismo é a teoria da folia permanente. (Aí, garoto! Até que enfim, eis um ótimo dogma).

2

O exemplo dos próprios Irmãos Marx mostra a unidade da teoria e prática marxista (por exemplo, quando Groucho insulta alguém enquanto Harpo depena sua
carteira ). Além disso, o marxismo é dialético (Chico não é o clássico comediante dialético?). Comediantes que fracassam em sintetizar teoria e prática (para não
mencionar aqueles que fracassam totalmente em pecar) são não-marxistas. Comediantes posteriores, fracassando em entender que a separação é “o discreto
charme da burguesia”, decaíram para meras gafes, por um lado, e mera tagarelice, por outro.

3

Como o G-Marxismo é prático, seus feitos não podem nunca ser reduzidos ao mero humor, entretenimento ou “arte”. (Os estetas, afinal de contas, estão menos
interessados na interpretação da arte do que na arte que interpreta.) Depois que um genuíno marxista assiste a um filme dos Irmãos Marx, ele diz para si mesmo:
“Se você achou isso engraçado, preste atenção à sua vida!”.

4

G-marxistas contemporâneos devem decididamente denunciar o “Marxismo” vulgar, de imitação, dos Três Patetas, Monty Python, e Pernalonga. Em vez do
marxismo vulgar, devemos retornar à autêntica vulgaridade marxista. Retoficação (2) serve igualmente para aqueles camaradas desiludidos que pensam que “a linha
correta” é o que o tira faz quando manda eles pararem no acostamento.

5

Marxistas com consciência de classe (isto é, marxistas conscientes de que não possuem nenhuma classe) devem rejeitar a “comédia” anêmica, da moda, narcisista,
de revisionistas cômicos como Woody Allen e Jules Feiffer. A revolução cômica já ultrapassou a mera neurose – ela é risonha mas não risível, discriminante mas
não discriminatória, militante mas não militar, e aventurosa mas não aventureira. Os marxistas percebem que hoje você deve olhar no espelho de uma casa
assombrada de parque de diversões para se ver da forma que você realmente é.

6

Embora não totalmente desprovido de vislumbres de insight marxista, o (sur)realismo socialista deve ser distinguido do G-Marxismo. É verdade que Salvador Dali
deu uma vez a Harpo uma harpa feita com arame farpado; no entanto, não há nenhuma evidência de que Harpo alguma vez a tenha tocado.

7

Acima de tudo, é essencial renunciar e execrar todo sectarismo cômico como o dos trotskos eqüinos. Como é bem sabido, Groucho repetidamente propunha o
sexo mas se opunha às seitas. Para Groucho, havia uma diferença entre ser um trotsko e estar louco para “trotar” (3). Além disso, o slogan trotsko “Salários para o
Trabalho Eqüino” cheira a reforma, não a folia. Os esforços trotskos para reivindicar Um dia nas Corridas e Os Gênios da Pelota como de sua tendência devem ser
indignadamente rejeitados; na verdade, A Mocidade é Assim Mesmo está mais na velocidade deles (4).

8

O assunto mais urgente que os G-Marxistas confrontam hoje é a questão do partido (5), que - ao invés do que pensam “marxistas” ingênuos, reducionistas – é mais
que apenas “Por que não fui convidado?” Isso nunca foi impedimento para Groucho! Os marxistas precisam de seu próprio partido disciplinado de vanguarda, pois
eles são raramente bem-vindos aos de qualquer outro.

9

Guiadas pelos dogmas fundamentais do desbehaviorismo e do materialismo histérico, as massas inevitavelmente abraçarão, não apenas o G-Marxismo, mas
também mutuamente uns aos outros.

10

O Groucho Marxismo, então, é o tour de farce da comédia. Como seguramente se diz que Harpo falou:
“Em outras palavras, a comédia será revoltosa ou não será!” Tanto por fazer, tantos para fazê-lo! Sobre seus Marx, está dada a largada! (6)


Notas:

1. No original, déclassé. (N. do Tradutor)

2. “Rectumfication”, neologismo bricalhão que Black inventou a partir de “retificação” e “reto” (rectum, canal do ânus). (N. do T.)

3. Trocadilho aqui intraduzível entre “Trots” (trotskistas) e “hot to trot” (excitado para trepar), sem esquecer a brincadeira com os eqüinos pois “to trot” significa
trotar. (N. do T.)

4. Um dia nas Corridas (A Day in the Races) e Os Gênios da Pelota (Horse Feathers) são filmes dos Irmãos Marx, enquanto A Mocidade é Assim Mesmo
(National Velvet) é um velho drama onde Liz Taylor atuou ainda garota. (N. do T.)

5. Mais um trocadilho neste texto pleno deles: “party” é tanto partido quanto festa em inglês. Para entender a piada melhor, leia o parágrafo com os dois
significados, substituindo onde houver “partido” por “festa”. (N. do T.)

6. Outro trocadilho praticamente intraduzível, desta vez com a exclamação que dá início a competições de corrida : “On your marks, get set –go!” aqui trocada por
“On your Marx, get set – go!”. (N. do T.)

Tradução de Ricardo Rosas

Fonte:
Página de Bob Black na Spunk: http://www.spunk.org/library/writers/black/
Rizoma: http://www.rizoma.net/interna.php?id=162&secao=intervencao

14.8.06

CAOS LINGUÍSTICO

AINDA NÃO UMA CIÊNCIA, mas uma proposição: que certos problemas de linguística possam ser resolvidos através da abordagem da linguagem como um
sistema dinâmico complexo, ou "campo caótico".
De todas as escolas originadas pela linguística de Saussure, temos especial interesse por duas: a primeira, "antilingüística", pode ser encontrada - no período
moderno - da partida de Rimbaud para a Abissínia à afirmação de Nietzsche "temo que, enquanto tivermos gramática, não teremos matado Deus"; passando pelo
dadaísmo; "o Mapa não é o Território" de Korzybski; pelos cut ups e pela "ruptura na sala cinza" de Burroughs; pelo ataque de Zerzan à própria linguagem como
representação e mediação.

A segunda é a linguística de Chomsky que, com sua crença numa "gramática universal" e seus diagramas em forma de árvores, representa (eu acredito) uma
tentativa de "salvar" a linguagem através da descoberta de "invariáveis ocultas", do mesmo modo que certos cientistas estão tentando "salvar" a física da
"irracionalidade" da mecânica quântica. Embora fosse de se esperar que Chomsky, como anarquista, ficasse do lado dos niilistas, a sua belíssima teoria em verdade
tem mais a ver com o platonismo ou com o sufísmo do que com o anarquismo. A metafísica tradicional descreve a linguagem como luz pura brilhando através dos
vidros coloridos dos arquétipos; Chomsky fala de gramáticas "inatas". As palavras são folhas, os ramos são frases, os idiomas maternos são limbos, as famílias de
linguagem são troncos e as raízes estão no "céu"... ou no DNA. Eu chamo a isso "hermetalingüística" - hermética e metafísica. O niilismo (ou a "Metalingüística
Pesada", em honra a Burroughs) parece-me ter levado a linguagem para um beco sem saída e ameaçado torná-la "impossível" (um grande feito, mas deprimente),
enquanto Chomsky mantém a promessa e a esperança de uma revelação de última hora, o que eu acho igualmente difícil de aceitar. Eu também gostaria de "salvar"
a linguagem, mas sem apelar para nenhuma "Assombração", ou supostas regras sobre Deus, dados e o universo.

Voltando a Saussure e suas anotações, postumamente publicadas, sobre anagramas na poesia latina, encontramos certas indicações de um processo que, de alguma
forma, foge da dinâmica signo/significante.
Saussure se deparou com a possibilidade de algum tipo de "meta"- lingüística que acontece dentro da linguagem em vez de ser imposta desde "fora" como um
imperativo categórico. Assim que a linguagem começa a atuar, como nos poemas acrósticos que ele examinou, ela parece ressonar com uma complexidade
autoexpansiva. Saussure tentou quantificar os anagramas, mas os números escapavam dele (como se envolvessem equações não-lineares). Além disso, ele começou
a encontrar os anagramas por todo lado, mesmo na prosa latina. Começou a se perguntar se estava tendo alucinações, ou se os anagramas eram um processo
natural inconsciente da parole. Abandonou o projeto.

Eu me pergunto: se quantidades suficientes de informações desse tipo fossem digeridas num computador, começaríamos a ser capazes de modelar a linguagem em
termos de sistemas dinâmicos complexos? As gramáticas, então, não seriam "inatas", mas emergiriam do caos espontaneamente como "ordens superiores" que
evoluem, no sentido da "evolução criativa" de Prigogine. As gramáticas poderiam ser pensadas como "Estranhos Atratores", como o padrão escondido que
"causou" os anagramas - padrões que são "reais", mas que têm "existência" apenas em termos dos sub-padrões que manifestam. Se o significado é elusivo, talvez
seja porque a própria consciência, e portanto a linguagem, seja fractal.

Considero essa teoria mais satisfatoriamente anarquista do que qualquer antilingüistica ou chomskyanismo. Ela sugere que a linguagem pode sobrepor-se à
representação e à mediação, não porque seja inata, mas porque é caótica. Ela sugere que toda experimentação dadaísta (Feyerabend designou sua escola de
epistemologia científica de "dadaísmo anárquico") com poesia sonora, gestos, chistes, linguagem bestial etc. não foi feita com o objetivo nem de descobrir nem de
destruir o significado, mas de criá-lo. O niilismo afirma sombriamente que a linguagem cria significado de forma "arbitrária". O Caos Linguístico alegremente
concorda com isso, mas adiciona que a linguagem pode superar a linguagem, que a linguagem pode criar liberdade a partir da confusão e da decadência da tirania
semântica.

Apêndice A de "TAZ (Temporary Autonomous Zone), Zona Autônoma Temporária" - Hakim Bey

10.8.06

"Diz-se que toda obra de arte resguarda um nonsense, bordando em suas bordas, margens, litorais a instauração da verdade, pela eclosão do ente desvelado, o
além do saber, o que transcende e aponta para o indizível, para o impossível, para o limite."

BISPO com QUIXOTE

7.8.06

Os chistes e sua relação com o inconsciente

(1905) [Freud,S.]

1905 Leipzig e Viena: Deuticke, Pp. ii + 206.

1912 2ª ed. Mesmos editores. Pp. iv + 207.

INTRODUÇÃO - DER WITZ UND SEINE BEZIEHUNG ZUM UNBEWUSSTEN



"(...)Outras idéias, mais ou menos inter-relacionadas, que têm emergido para a definição ou a descrição dos chistes, são as seguintes: um contraste de idéias, sentido no nonsense, desconcerto e esclarecimento.

Definições como a de Kraepelin enfatizam como fator principal o contraste de idéias. Um chiste é a conexão ou a ligação arbitrária, através de uma associação verbal, de duas idéias, que de algum modo contrastam entre si. (...)" Zur Psychologie des Komischen, Kraepelin, E. (1885), Philosophische Studien, ed. W. Wundt. 2, 128 e 327, Leipzig.]

Sobre esta citação de Kraepelin, Freud conclui:

"(...)Se esse ponto for mais desenvolvido, o contraste entre sentido e nonsense torna-se significante. Aquilo que, em certo momento, pareceu-nos ter um significado, verificamos agora que é completamente destituído de sentido. Eis o que, nesse caso, constitui o processo cômico. Um comentário aparece-nos como um chiste se lhe atribuímos uma significância dotada de necessidade psicológica, e tão logo tenhamos feito isso, de novo o refutamos. Essa significância pode querer dizer várias coisas. Atribuímos sentido a um comentário e sabemos que logicamente ele não pode ter nenhum. Descobrimos nele uma verdade, fato impossível de acordo com as leis da experiência ou com nossos hábitos gerais de pensamento.(...)".

http://arsm0.tripod.com/extensao/id14.html

3.8.06

Fnord

Fnord é chá de erva sem a erva
Fnord é uma montanha muito, mas muito alta
Fnord é a razão pela qual uma caixa de camisinhas vem com 12 ao inves de 10
Fnord é a linha azul na estrada que nunca é pintada

Fnord é o lugar pra onde as meias vão quando somem da lavanderia
Fnord é um jogo de video game como o pacman, mas sem os pontinhos
Fnord é uma nuvenzinha estufada que se vê as 5 da tarde

Fnord é a etiqueta branca que vem nas fitas K7
Fnord é onde os ônibus se escondem a noite
Fnord é a página branca no final do livro
Fnord é o barulho que a árvore faz quando cai no bosque e ninguém ouve

Fnord é o parafuso que cai do carro sem nenhuma razão
Fnord é a razão pela qual Burger King usa papel ao invés de papel
alumínio
Fnord é o desgaste no seu tênis
Fnord é aquele pontinho laranjado nas paginas amarelas

Fnord é o picles sem as lombadas
Fnord é a razão pela qual os patos comem lama
Fnord é um pão tostado sem o pão
Fnord é a cortina veneziana sem as lâminas

Fnord é as aspas na palavra "droga"
Fnord é a origem de todos os zero bits do seu computador
Fnord é o eco do silêncio
Fnord é o cheiro-verde no prato da vida

Fnord é o imposto sobre felicidade
Fnord é o que seu cerebro sente quando se segura o folego por muito
tempo
Fnord é a razão pela qual homosexual enrustidos continuam enrustidos
Fnord é a série de e-mails chatos

Fnord é o buraco do donut
Fnord é o donut todo
Fnord é a cor que somente os cegos podem ver
Fnord é o serial number na caixa de sucrilhos

Fnord é o universo com entropia decrescente
Fnord é o yin sem o yang
Fnord é a razão pela qual HTML tem tantos ...
Fnord é o trevo de quatro folhas que perdeu uma

Fnord nunca dorme
Fnord é a "eia" na palavra baleia
Fnord não é uma partícula ou mesmo uma onda
Fnord é o espaço entre os pixeis do seu monitor

Fnord é o antebellum flagellum fella.
Fnord é o aspirador de pó consciente

Fnord é o menor número maior que zero
Fnord vive no espaço vazio acima do ponto decimal
Fnord é a cor estranha nas costas do dragão
Fnord foi visto a ultima vez em Omaha, Nebraska.

Fnord é o pioneiro da palavra pioneiro
Fnord é o último grão de areia que você nao consegue tirar do seu sapato
Fnord guarda uma sombrancelha extra no bolso
Fnord é a razão pela qual os médicos te pedem para tossir

Fnord é o "ooo" in vrooom nos carros de corrida
Fnord usa duas banheiras de uma vez

31.7.06

Surrealismo e Histeria

(André Breton e Louis Aragon)

Nós, surrealistas, consideramos que cumpre-se celebrar aqui o cinqüentenário da histeria, a maior descoberta poética do fim do século XIX, e isto no mesmo momento em que o desmembramento da histeria parece fato consumado. Nos que tanto amamos essas jovens histéricas – cujo tipo perfeito nos é dado pelo caso da deliciosa X.L. (Augustine) que deu entrada na Salpetriere no serviço do dr.Charcot no dia 21 de outubro de 1875, aos 15 anos e meio -, como não seriamos tocados pela laboriosa refutação de distúrbios orgânicos no processo contra a histeria que será perpetrado para sempre pelo olhar único dos médicos? Que pena! M.Babinsky, o homem mais inteligente que abordou a questão, ousava publicar em 1913: “Quando uma emoção sincera e profunda sacode a alma humana, não há mais lugar para a histeria.” Eis ainda o que de melhor nos ensinaram. Freud, que tanto deve a Charcot, lembra-se do tempo em que, pelo testemunho das sobreviventes, os residentes de Salpetriere confundiam seu dever profissional com o prazer do amor, quando ao cair da noite as doentes os encontravam la fora ou os recebiam em seus leitos? Eles repertoriavam em seguida pacientemente, em nome da causa medica, que não se defende, as atitudes passionais tidas por patologias que lhes eram, e ainda o são, humanamente tão preciosas? Após 50 anos a Escola de Nancy esta morta? Se ainda vive, o dr. Luys esqueceu-a? Mas onde se encontra os casos descritos por Néri sobre os tremores de terra de Messine? Onde estão os zuavos torpediados pelo Raymond Roussel da ciência, Clovis Vincent?

Diversas definições da histeria foram dadas ate hoje: divina na Antiguidade, infernal na idade media (dos possuídos de Loudun aos flagelados N.-D. des Pleurs, viva Madame Chantelouve!), definições míticas, eróticas ou simplesmente líricas, definições sociais, definições cientificas. É fácil opor a tais definições essa “doença complexa e proteiforme chamada de histeria que escapa a qualquer definição” (Bernheim). Os espectadores do belíssimo filme A feitiçaria através dos tempos recordam certamente terem encontra na tela ou na sala ensinamentos mais vivos do que os dos livros de Hipocrates e de Platão, onde o utero pula como uma cabrita; de Galeno, que imobiliza a cabre; de Fernel, que recoloca em cena no século XVI e se sente sob sua mão andar até o estomago. Eles viram os chifres do animal crescerem, crescerem ate tornarem-se os chifres do diabo. De sua parte o diabo faltou. As hipóteses positivistas dividem entre si sua herança. A crise histérica toma forma independente da própria histeria, com sua aura soberba, suas quatro fases – sendo que a terceira nos retem por seus mais expressivos e mais puros quadros vivos- e sua simplíssima resolução na vida normal. A histeria, clássica em 1906, perde suas características: “A histeria é um estado patológico que se manifesta por distúrbios passiveis de serem reproduzidos por sugestão em alguns sujeitos com perfeita exatidão e que são sucetiveis de desaparecer so pela influencia da persuasão (contra-sugestao)” (Babinski).

Verificamos nessa definição apenas um momento do devir da histeria. O movimento dialético que a fez nascer segue seu curso. Dez anos mais tarde, sob o deplorável disfarce do pitiatismo, a histeria tende a retomar seus direitos. O medico se espanta. Ele quer negar o que não lhe pertence.

Propomos, portanto, em 1928 uma nova definição da histeria: “A histeria é um estado mental mais ou menos irredutivel que se caracteriza pela subversão das relações que se estabelecem entre o sujeito e o mundo moral ao qual ele acredita em termos práticos pertencer independente de todo sistema delirante. Esse estado mental é fundado na necessidade de uma sedução recíproca, que explica os milagres apressadamente aceitos pela sugestão (ou contra-sugestao) medica. A histeria não é um fenômeno patológico e pode, de todo modo, ser considerada como um meio supremo de expressão”.

A liçao de Charcot

28.7.06

Editora Deriva

É difícil classificar a deriva como uma editora, ela está mais para um espasmo, uma caminhada sem rumo pelo centro da cidade estando de porre.

A proposta é fazer livros baratos e de qualidade usando baixa tecnologia, no velho estilo do it yourself ou low-tech para os mais pós-modernos. Mas a produção de um livro é só o primeiro passo, buscamos construir novas relações na produção e distribuição usando moedas socias, flertando com clubes de trocas e todo tipo de parceria maluca.

O preço dos livros no Brasil sempre foi um absurdo e a desculpa recorrente das editoras é de que o brasileiro lê pouco e por isso compensa os altos custos de produção com preços maiores para um público elitizado. Se formos seguir esse discurso do mundo empresarial nunca vamos sair do atoleiro em que se encontra o mercado editorial no Brasil e a sua total mercantilização com seus harry potters e códigos da vinci.

É por isso que incríveis iniciativas independentes estão pipocando na internet tentando quebrar esse cerco: Projeto Periferia, Coletivo Sabotagem, etc. Iniciativas que nos trouxeram a inspiração para lançar a Editora Deriva na perspectiva de transpor a militância pela democratização da cultura para fora da internet.

A Editora Deriva ainda é embrionária, mas já contamos com cinco títulos, pretendendo alcançar dez até o final do ano. Confira e apóie essa idéia e todas as outras editoras independestes que estão por ai traduzindo, editando e distribuindo ótimos textos.

Títulos disponíveis:
TAZ - Hakim Bey
O Casamento do Pequeno Burguês - Bertold Brecht
As Criadas - Jean Genet
Entre Quatro Paredes - Jean-Paul Sartre
O Diário de um Louco - Nicolai Gogol

Em breve:
Bolo´bolo - PM
Os Justos - Camus
Miséria do Movimento Estudantil - Situacionistas


Site da editora:
Editora Deriva

Comunidade no Orkut

Email:: excambo@yahoo.com.br

25.7.06

O STATUS ONTOLÓGICO DA TEORIA DA CONSPIRAÇÃO

A teoria da conspiração é uma ilusão da Direita que também infectou a Esquerda? Teóricos da conspiração esquerdistas algumas vezes fazem um uso acrítico dos textos dos mais direitistas teóricos da conspiração – pesquisando por detalhes do Assassinato de JFK no trabalho do Liberty Lobby (1), adquirindo noções no estilo da John Birch Society (2) sobre os internacionalistas “liberais” CFR/Bilderberg/Rockefeller (3) etc. etc. Como o anti-semitismo pode ser encontrado tanto na Esquerda quanto na Direita, ecos dos Protocolos podem ser escutados de ambas as direções. Mesmo alguns anarquistas são atraídos pelo “Revisionismo Histórico”. O anticapitalismo (4) ou populismo econômico na Direita tem seu contraponto na Esquerda com o “Fascismo Vermelho”, que irrompeu na superfície da História no pacto Hitler/Stalin, e retornou para nos assombrar na bizarra combinação européia de “Terceira Onda” do extremismo de esquerda com o de direita, um fenômeno que aparece nos EUA com o niilismo libertino e o “satanismo” de grupos anarco-fascistas como a Amok Press (5) e a Radio Werewolf (6) – e a teoria da conspiração desempenha um importante papel em todas estas ideologias.


Se a teoria da conspiração é essencialmente da facção da direita, só pode ser assim por que ela pressupõe uma visão da História como o trabalho de indivíduos mais que de grupos. De acordo com este argumento, uma teoria no estilo de Mae Brussel (7) (ela acreditava que os nazistas tinham se infiltrado na Inteligência e Governo americanos no nível administrativo) poderia parecer esquerdista mas de fato não fornece nenhuma sustentação para uma genuína análise dialética, uma vez que ignora a economia e a luta de classes como forças causais, e em vez disso atribui todos os eventos às maquinações de indivíduos “escondidos”.

Mesmo a Esquerda anti-autoritária pode algumas vezes adotar esta opinião rasa sobre a teoria da conspiração, apesar do fato de não estar presa a nenhuma crença dogmática no determinismo econômico. Tais anarquistas concordariam que acreditar em teoria da conspiração é acreditar que as elites podem influenciar a História. O anarquismo postula que as elites são simplesmente arrastadas pelo fluxo da História e que sua crença em seu próprio poder ou instrumentalidade é pura ilusão. Se fosse para se acreditar no contrário, tais anarquistas argumentam, então Marx e Lênin estariam certos, e o vanguardismo conspiratório seria a melhor estratégia para o “movimento do social”. (A existência do vanguardismo prova que a Esquerda – ou pelo menos a Esquerda autoritária – não foi simplesmente contaminada acidentalmente pela teoria da conspiração: o vanguardismo É conspiração!) Os Leninistas dizem que o estado é uma conspiração, seja de Direita ou de Esquerda – faça a sua escolha. Os anarquistas argumentam que o estado não “tem” poder em nenhum sentido absoluto ou essencial, mas que ele meramente ursupa o poder que, em essência, “pertence” a cada indivíduo, ou à sociedade em geral. O aspecto aparentemente conspiratório do estado é portanto ilusório – pura masturbação ideológica da parte de políticos, espiões, banqueiros e outras escórias, servindo cegamente aos interesses de sua classe. A teoria da conspiração é, por conseguinte, de interesse apenas como um tipo de sociologia da cultura, um rastreamento das fantasias ilusórias de certos grupos de incluídos e de excluídos – mas a própria teoria da conspiração não tem nenhum status ontológico.

Esta é uma hipótese interessante de muito valor, especialmente como uma ferramenta crítica. No entanto, como uma ideologia, ela sofre da mesma falha que qualquer outra ideologia. Ela constrói uma Idéia absoluta, então explica a realidade em termos de absolutos.


A Direita e a Esquerda autoritárias compartilham uma visão do status ontológico das elites ou das vanguardas na História; a resposta anti-autoritária é transferir o peso ontológico-histórico para indivíduos ou grupos; mas nenhuma das teorias se importou em questionar o status ontológico da História, ou, quanto a isso, da própria ontologia.


No sentido tanto de confirmar quanto de negar a teoria da conspiração categoricamente, deve-se acreditar na categoria da “História”. Mas desde o século 19, a “História” se fragmentou em dúzias de partículas conceituais – etno-história, psico-história, história social, história das coisas e idéias e mentalidades, cliometria ( 8 ), micro-história – tais não são ideologias históricas rivais, mas simplesmente uma multiplicidade de histórias. A noção de que a História é o resultado da luta cega entre interesses econômicos, ou de que a História “É” sob qualquer condição algo específico, não pode realmente sobreviver a esta fragmentação numa infinidade de narrativas. A abordagem produtiva a uma tal idéia fixa não é ontológica mas epistemológica; ou seja, agora perguntamos não o que a “História” “é”, mas de preferência o que e como podemos saber sobre e a partir das muitíssimas estórias, supressões, aparecimentos e desaparecimentos, palimpsestos e fragmentos dos múltiplos discursos e múltiplas histórias das complexidades inextricavelmente emaranhadas do devir humano.


Então deveríamos pressupor (como um exercício epistemológico, se nada mais) a noção de que embora seres humanos sejam arrastados ou movidos por interesses de classe, forças econômicas, etc., podemos também aceitar a possibilidade de um mecanismo de feedback, por meio do qual as ideologias e ações tanto de indivíduos quanto de grupos possam modificar as reais “forças” que as produzem.


De fato, me parece que, como anarquistas de um tipo ou de outro, devemos adotar uma tal visão das coisas, ou então aceitar que nossa agitação, educação, propaganda, formas de organização, levantes, etc., são essencialmente fúteis, e que só a “evolução” pode ou irá ocasionar qualquer mudança significativa na estrutura da sociedade e da vida. Isto pode ou não ser verdade a respeito da longa duração do devir humano, mas é evidentemente falso no nível da experiência individual da vida cotidiana. Aqui, uma espécie de existencialismo tosco prevalece, de tal forma que devemos agir como se nossas ações pudessem ser efetivas, ou então sofrer em nós mesmos uma escassez de devir. Sem a vontade da auto-expressão em ação, somos reduzidos a nada. Isto é inaceitável. Portanto, mesmo que se pudesse provar que toda ação é ilusão (e não acredito que qualquer evidência nesse sentido esteja disponível), ainda nos defrontaríamos com o problema do desejo. Paradoxalmente somos forçados (sob a pena da total negação) a agir como se livremente escolhêssemos agir, e como se a ação pudesse causar mudança.


Com base nisso, parece possível elaborar uma teoria da conspiração não-autoritária que nem negue isso completamente, nem o eleve ao status de uma ideologia. Em seu sentido literal de “respirar junto”, a conspiração pode até ser pensada como um princípio natural de organização anarquista. Face a face, não mediados por qualquer controle, juntos construímos nossa realidade social para nós mesmos. Se devemos portanto fazê-lo clandestinamente, no sentido de evitar os mecanismos de mediação e controle, então perpetramos um tipo de conspiração. Mas tem mais: podemos também ver que outros grupos podem se organizar clandestinamente não para evitar o controle mas para tentar impô-lo. É inútil fingir que tais tentativas são sempre fúteis, porque mesmo que eles fracassem em influenciar a “História” (ou o que quer que isso seja), eles podem certamente ter impacto e se intersectar com nossas vidas cotidianas.

Para tomar um exemplo, qualquer um que negue a realidade da conspiração deve certamente encarar uma difícil tarefa quando tentar justificar as atividades de certos elementos dentro da Inteligência e do Partido Republicano nos EUA durante as últimas poucas décadas. Não importa o Assassinato de Kennedy, esta perda de tempo espetacular; esqueça os remanescentes da Organização Gehlen (9) que estavam à espreita em Dallas; porém, como se pode sequer começar a discutir sobre os arapongas de Nixon, o Irã-Contra, a “crise” das poupanças e empréstimos (S&L) (10), as guerras-show contra a Líbia, Granada, Panamá e Iraque, sem alguma recorrência ao conceito de “conspiração”? E mesmo que acreditemos que os conspiradores estavam agindo como agentes de forças ocultas, etc., etc., podemos negar que suas ações tenham realmente produzido ramificações no nível de nossas próprias vidas cotidianas? Os Republicanos lançaram uma aberta “Guerra às Drogas”, por exemplo, enquanto secretamente usaram dinheiro da cocaína para financiar insurreições de direita na América Latina. Alguém que você conhecia morreu na Nicarágua? Alguém que você conhecia foi apanhado na hipócrita “guerra” à maconha? Alguém que você conhecia caiu na desgraça do vício em crack? (Não vamos nem mencionar os negócios da CIA com heroína no sudeste da Ásia ou no Afeganistão).

Como aponta Carl Oglesby, a teoria da conspiração mais sofisticada não pressupõe nenhuma trama singular, todo-poderosa, suprema, a cargo da “História”.


Isso com certeza seria uma forma de paranóia estúpida, seja da Esquerda ou da Direita. Conspirações ascendem e caem, brotam e decaem, migram de um grupo para outro, competem entre si, fazem conluio, se colidem, implodem, explodem, falham, têm sucesso, suprimem, forjam, esquecem, desaparecem. Conspirações são sintomas das grandes “forças ocultas” (e portanto úteis como metáforas, se nada mais), mas elas também realimentam essas forças e algumas vezes até afetam ou infectam ou têm efeito sobre elas. Conspirações, de fato, não são A forma com que a história é feita, mas são antes partes de um vasto conjunto de miríades de formas nas quais nossas múltiplas estórias são construídas. A Teoria da Conspiração não pode explicar tudo mas pode explicar algo. Se ela não tem status ontológico, ainda assim ela realmente tem seus usos epistemológicos.


Aqui vai uma hipótese:


A história (com “h” minúsculo) é um tipo de caos. Dentro da história estão embutidos outros caos, se se pode usar um tal termo. O capitalismo “democrático” tardio é mais um destes caos, no qual o poder e o controle se tornaram extraordinariamente sutis, quase alquímicos, difíceis de localizar, talvez impossíveis de definir. Os escritos de Debord, Foucault, e Baudrillard, levantaram a possibilidade de que o “poder em si” está vazio, “desaparecido”, e foi substituído pela mera violência do espetáculo. Mas se a história é um caos, o espetáculo só pode ser visto como um “atrator estranho” (11), mais que como algum tipo de força causadora. A idéia de “força” pertence à física clássica e tem pouca função a desempenhar na teoria do caos. E se o capitalismo é um caos e o espetáculo um atrator estranho, então a metáfora pode ser ampliada – podemos dizer que as conspirações “Republicanas” são como os reais padrões gerados pelo atrator estranho. As conspirações não são causais – mas, então, nada é realmente “causal” no velho sentido clássico do termo.

Uma maneira útil pela qual podemos, por assim dizer, investigar no caos que é a história, é olhar através das lentes fornecidas pelas conspirações. Podemos ou não acreditar que as conspirações são meras simulações do poder, meros sintomas do espetáculo – mas não podemos rejeitá-las como desprovidas de qualquer significação.


Mais que falar da teoria da conspiração, poderíamos em vez disso tentar elaborar uma poética da conspiração. Uma conspiração seria tratada como um constructo estético, ou constructo de linguagem, e poderia ser analisada como um texto. Robert Anton Wilson fez isso com sua longa e divertida fantasia “Illuminatti”. Podemos também usar a teoria da conspiração como uma arma de agit-prop. Conspirações do “poder” fazem uso da pura desinformação; o mínimo que podemos fazer em retaliação é rastreá-la até sua origem. Sem dúvida deveríamos evitar a mística da teoria da conspiração, a ilusão de que a conspiração é todo-poderosa. Conspirações podem ser dinamitadas. Elas podem até mesmo ser impedidas. Mas temo que elas não possam simplesmente ser ignoradas. A recusa em admitir qualquer validez à teoria da conspiração é ela mesma uma forma de ilusão espetacular – crença cega no mundo cor-de-rosa liberal, racional, no qual todos temos “direitos”, no qual “o sistema funciona”, no qual “valores democráticos prevalecerão a longo prazo” por que a natureza assim o determinou.


A História é uma grande bagunça. Talvez conspirações não funcionem. Mas temos de agir como se elas realmente funcionassem. Na realidade, o movimento não-autoritário não somente necessita de sua própria teoria da conspiração, ele necessita de suas próprias conspirações. “Funcionem” elas ou não. Ou respiramos juntos ou nos sufocamos todos por iniciativa própria. “Eles” estão conspirando, nunca duvide disso, esses palhaços sinistros. Não apenas deveríamos nos armar com a teoria da conspiração, deveríamos ter nossas próprias conspirações – nossas TAZ – nosso comando de mercenários da guerrilha ontológica – nossos Terroristas Poéticos – nossas maquinações do caos – nossas sociedades secretas. Proudhon assim o disse. Bakunin assim o disse. Malatesta assim o disse. É a tradição anarquista.


Notas:


1. Controversa organização política direitista de Washington, DC, conhecida como anti-comunista e anti-semita, e que através de seu jornal Spotlight lançou uma campanha contra o agente da CIA E. Howard Hunt, acusando-o de conspirador no assassinato de J. F. Kennedy. (Nota do Tradutor)


2. Organização de ultradireita criada em 1958 em Indianápolis em homenagem a um agente da CIA e também missionário protestante. (N. do T.)


3. Conta a lenda que o CFR (Council on Foreign Relations), o Conselho de Relações Exteriores, é o braço americano de uma sociedade ultra-secreta originalmente organizada na Inglaterra, com os planos de instruir e governar todas as fases da política externa americana, e o objetivo final de dissolver as fronteiras mundiais e estabelecer um governo mundial único. Do CFR teriam participado quase todos os diretores da CIA e todos os secretários da Defesa dos EUA. Os Bilderberg seriam uma poderosíssima e semi-secreta sociedade da elite internacional que se reúne anualmente para definir os programas econômicos e políticos mundiais, com representantes somente do mundo anglo-saxão e da Europa ocidental. David Rockefeller, por sua vez, teria sido patrono do CFR, membro dos Bilderberg e criador da denominada Comissão Trilateral, outra dessas sociedades secretas da elite mundial que incluiria aqui membros do Japão. Teorias conspiratórias “clássicas” ligam essas três organizações ao grupo dos Illuminati, numa trama de dominação mundial. (N. do T.)

4. O anticapitalismo de direita se traduz, entre outras coisas, pela nostalgia aristocrática de um passado pré-industrial por certos grupos ultradireitistas, como, por exemplo, a TFP no Brasil, ou certos grupos monarquistas. (N. Do T.)


5. Editora underground de Los Angeles, célebre nos meios contraculturais por publicar os Amok Dispatches, verdadeiras fontes bibliográficas de todo tipo de material subterrâneo, conspiratório, transgressor, banido. (N. do T.)

6. Banda gótico-eletrônica de tendência satanista formada por Nickolas Schreck e Zeena LaVey, filha de Anton LaVey, fundador da Igreja de Satã.(N. do T.)

7. Mae Magnin Russel é tida como a “rainha das teorias da conspiração”. Ela acreditava, por exemplo, que os assassinatos de Kennedy e de Martin Luther King, os assassinatos perpertrados por Charles Manson e seu grupo, e o sequestro de Patty Hearst tinham todos sido planejados pela extrema direita juntamente com a CIA, o FBI e a Máfia numa massiva conspiração feita para desacreditar a esquerda e estabelecer um estado fascista. (N. do T.)


8. Cliometrics ou “história social-científica quantitativa” designa uma técnica de análise histórica fundada na quantificação de dados empíricos. Seus defensores mais radicais consideram-na o método científico por excelência da análise histórica.

9. Organização de inteligência baseada na Alemanha, a Gehlen Org seria composta de antigos agentes da SS e da Gestapo - incluindo, entre outros, Klaus Barbie -, tendo sido fundada, na Alemanha do pós-guerra, com a ajuda do advogado dos Rockfeller, Allen Dulles, que teria contratado o espião alemão Reinhart Gehlen para reviver a agência de espionagem SS e se tornaria depois a agência espiã BND da Alemanha Ocidental. Na verdade, a CIA teria sido formada a partir da Gehlen. (N. do T.)



10. S & L (Savings and Loans) - No final da década de 80 e início da de 90, as “poupanças e empréstimos” norte-americanos faliram. Em 1984, a administração e o Congresso dos EUA acreditavam que a crise das poupanças e depósitos era em torno de 20 a 30 milhões de dólares. Operadores do setor então inundaram Washington com lobistas, contribuições para campanhas, e viagens gratuitas de avião para recantos paradisíacos, entre outros agrados. Como resultado, o problema foi varrido para debaixo do tapete. Ele só voltou a aparecer nas eleições presidenciais de 1988, quando se descobriu uma crise que alcançava entre 400 e 500 bilhões de dólares. (N. do T.)



10. Na teoria do caos, atratores estranhos são sistemas dinâmicos atraentes e magnéticos que quando entram em estado de caos passam a ser designados como tais. Em 1970, físicos passaram a estudar os sistemas dinâmicos do imprevisível, denominando-os de atratores estranhos, expressão usada por David Ruelle e Floris Takens. Pelo fato dos atratores não serem nem curvas e nem superfícies lisas, mas objetos de dimensões não inteiras, Benoît Mandelbrot denominou-os de fractais. (N. do T.)


Tradução de Ricardo Rosas


Link: Site de Hakim Bey (http://www.hermetic.com/bey).